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Posts Tagged ‘conto gay’

Entrega para Jezebel ( parte 2)

            O interfone tocou. Ainda estava enxugando seu rosto da última gozada. Inquietou-se. À porta, bateram. O interfone tocou novamente. Bateram na porta mais uma vez.

             Inquietou-se. Ele não sabia o que fazer. À porta deveria ser qualquer pessoa com mais intimidade, pois teve acesso sem muitas restrições. Já ao interfone, não sabia quem poderia ser. Ontem à noite havia passado horas na internet. Os toques eram sôfregos pela procura do prazer adequado. As limitações eram claras: nada de homens muito fraquinhos, que passassem as noites sob telhados. Nada destes homens de unhas pintadas e bem desenhas. Tudo menos isso. Adorava os homens maiores, bem grandes; grandes formas; grandes expectativas. Esses sim tinham seu apreço.

             As fotos pululavam no seu computador intensamente. Todos os tipos. Não tinha como selecioná-las. Seu apelo podia atingir qualquer um. A mensagem era explícita: “grandes prazeres com a pequena Jezebel”. Era assim que chamava a atenção dos homens. Todos eles. E, também por isso, vinham todos.

             “Não curto esses tipos pequeninos, com muito pouco a dar”. Revoltou-se. Com seus dedos pequenos dava vazão à velocidade de sua destreza vernacular. Ainda que percebesse a perda de tempo em respondê-lo, sempre se irritava com tais provocações. Até porque, causava-lhe certo interesse sexual por estes mais difíceis. Esses lhe proporcionavam mais prazer por conta de sua capacidade de convencê-los do contrário. Pensava consigo que em todo o homem havia aquele desejo mais recôndito de curiosidade; ou mesmo que esse desejo se mascarasse em superioridade, sempre um ou dois drinks revelariam a verdadeira fonte de prazer.

             Ele tentava, às vezes por horas, convencer de que poderia completar a necessidade de qualquer homem. Perdia seu tempo, mas não a paciência com dois ou três desses tipos. Conseguia manejar duas ou três personagens ao mesmo tempo. E nunca perdia o tempo dessas falas. Sempre estava pronto. Nenhuma solicitação ficava triste. Tinha sempre a fala e a foto para qualquer desejo. Não raro, perdia-se num jogo de voyeurismo. Mas não tinha fim, era somente aquele prazer do outro; não do seu em si. Mas daquela satisfação do rosto alheio em meio a rápidos toques; rápidas imagens; pensamentos sujos; performances solitárias; sedução virtual e ausência de sincero retorno.

             Mas o que lhe dava prazer era a pequena Jezebel. Ela, no entanto, nunca era virtual. Recusava-se a deixá-la ser virtual. Seu jogo de sedução e prazer era sempre real: luzes, cortinas e suave maquiagem. Ela nem sempre atuava. Mas quando atuava, deveria ter uma preparação.

             E o interfone não parava de tocar. À porta, desistiram de bater. Ouviu-se o barulho distante de passadas descendo as escadas. Ele deixou o interfone tocar mais uma vez. Correu para a pequena varanda da suíte e pode vislumbrar, pelo reflexo dos espelhos da fachada dos vizinhos, o corpo que se distanciava na imagem: era o soldadinho. Apaziguou a alma. Aquele viria, decerto, mais vezes, outras vezes.

             De um pulo alcançou o interfone:

            – Alô, pode subir, disse apressadamente. Pôs o fone no gancho, correu para o quarto. Jezebel precisava  de chita limpa.

 

                                                                                                                      …Continua

Ele não beijava ( Final)- o conto completo encontra-se na página Contos.

             Ele tinha certeza de que nesses anos havia apenas beijado uma única boca além da dele. Ele nunca havia traído. Aquele beijo foi apenas uma fraqueza diante de tantas desventuras por qual passava sua relação. Às vezes se perguntava se realmente deveria ser somente dele. Mas no íntimo acreditava que tudo redundaria em compromisso sério.

            Mas hoje parecia que seu mundo havia desabado. Não podia acreditar que em suas mãos estava a confirmação de sua sentença antecipada de morte. “-Não, não…” disse reiteradas e inaudíveis vezes. Apenas para si. Guardou aquele momento. Silenciou em si uma verdade mortal.

            “-Como pude ter sido atingido pela foice mortal, se ao menos não me expusera a nenhum risco?” Sua mente se perguntava sem respostas. Um flashback de momentos diversos passou pela sua cabeça. Em minutos toda sua vida tinha sido passada a limpo.

            Pensou, pensou e não havia uma pessoa sequer que poderia ter sido tão cruel e insensível. Olhou novamente para o exame e não quis acreditar. Pensou em ligar para o melhor amigo. Mas tinha receio da rejeição, da conseqüente pena e de uma revolução em sua vida.

            Pensou, pensou…

            Havia uma possibilidade sim. Uma loucura de pensamento. Ficou a contemplar a foto do outro. O outro. Aquele único objeto de sua atenção e devoção. O outro que tinha em si a definição de castidade e ingenuidade. Isso, o outro era ingênuo. Não podia ser ele o algoz. Mas por dentro pressentia a dor de uma punhalada iminente; um corte vivo, sangrando quase que real. Via na foto os olhos dele em tom de vermelho. Lágrimas pareciam cair e caíam com a violência de um rio. Ficou parado fitado os olhos do outro. Vi-o de joelhos implorando perdão. E o rio inundava sua vida de ódio, de medo, de morte.

            Pensou mais uma vez na possibilidade como um erro imperdoável. Não podia ser ele.

 

(…)

 

            Aquele dia tinha demorado anos. O tempo parecia ter parado, mortificado. O sangue tomava de conta de todo o apartamento e quase poderia ter-lhe sufocado. Então, o outro chega. O encontro havia sido marcado sem nenhuma pretensão. Ele havia controlado a emoção, enquanto o outro viria ao encontro com a alma cheia de sua constante ingenuidade.

            “-O que significa isso?”, perguntou sem deixá-lo entrar. E sem saber do que se tratava, pegou os papéis e leu atentamente. Uma espécie de brisa gelada percorreu todo seu corpo e deixou-o imóvel, sem palavras. Por alguns instantes olhou fixamente o papel sem saber o que fazer.

             “Vamos, o que você tem a dizer?”

             “Eu, eu… vou te ajudar…” Falou sem pensar.

             “Como vai me ajudar? Não te preocupa o fato de eu ser o que não posso ser mais; de não ter mais o tempo de amanhã? É assim que deve ser?” Perguntou ele quase chorando.

            O outro ainda não conseguia se desvencilhar do frio que o petrificava. O papel ficou refletindo uma luz de culpa, focando em sua face o nome do pior dos assassinos. Aquele algoz que poderia ter se furtado do encargo e ter-lhe perdoado de seus próprios erros. “Poderia ter evitado“, pensou como se fosse seu último pensamento. De repente, num impulso inconseqüente, correu de encontro a janela aberta como se quisesse voar para longe dos problemas. Quis saltar, para do alto, se sentir leve; mais livre; menos perigoso. Tentou correr desesperadamente e, no impulso para a morte, seu braço o impedira.

            Ele segurou forte o braço do outro. Ele não deixaria que seu grande amor fosse perdido de uma forma trágica. Não imaginava que seu plano para a confissão terminasse em mais dor. Queria apenas a assunção da culpa e um compromisso mais sério. Queria ele por completo, sem mais segredos e sem distâncias. Queria-o assim, bem perto; sem mentiras, sem desculpas, sem mistério. Queria-o assim bem perto de sua pele, bem próximo de seu rosto e demoradamente perdido em sua boca.

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Ele não beijava ( parte IV)

           O telefone tocou. O nome dele piscava como se fosse um grande anúncio, uma propaganda de um novo circo na cidade. Ficara minutos a olhar o visor do celular, hipnotizado pelas letras, cores e o som melódico quase embriagante do toque do celular. A música foi escolhida ao léu, especialmente escolhida para aquelas ligações de estranhos, de pessoas desconhecidas.

           O telefone tocou por mais alguns minutos e ele ficou sem ação. “- Só podia ser ele”, pensou alto.

            A música parou. Ficou desesperado. “- Será que era ele?” Pegou o celular como quem quisesse que ele falasse o número. Apertou os botões procurando resgatar as ligações. Mas acabara descobrindo que a ligação tinha sido feita de forma oculta, não revelando de qual número de celular ela havia partido. Enlouqueceu. Quis quebrar seu celular. Pôs a roupa para a malhação e resolveu ir à academia de ginástica.

            Entrou como louco indo em direção ao  local do último encontro. Repetiu o exercício várias vezes até que a hora azada coincidisse com seu relógio. Nada aconteceu. Cansou-se daquela espera. Voltou pra casa.

            Era quarta-feira, como de costume, abriu seu vinho e o sorveu até a última gota. Deitou-se em seu canto preferido. Pensou na morte, Emile Dinckson, Macário e adormeceu.

            Estava na casa de seus pais. Estava no quintal amontoando um monte de papéis amarelos. Ele estava com o semblante fixo em suas mãos, o olhar não se desviava do vidro de álcool e os fósforos. Então, lentamente jogou, em quantidades espaçadas, o álcool em cima do monte de papéis. Cada gota do líquido manchava as inúmeras frases escritas quando ainda jovem. Cada palavra significava uma dor, uma sensação perdida, um desejo velado. Cada gota manchava e embebia de morte cada letra, cada frase, cada espaço vazio. Então jogou o fósforo aceso. A mancha se transforma numa grande bola de fogo. Tudo se ilumina e seu rosto se perde entre as labaredas e a fumaça. Sua mãe grita:

“- O que é isso meu filho?”. “ Não se pode brincar com fogo”, bradou nervosamente.

            A dor na cabeça parecia-lhe roubar a razão. Acordara como se tivesse bebido trezentas doses de marguerita a base de Jose Cuervo. Sua mente não dedilhava as impressões da noite anterior. Ficava sempre assim quando perdia o controle das coisas. Nunca soubera lidar com a ansiedade. Todas a suas unhas podiam cobrar-lhe a dor incomensurável de suas pontas perdidas e preocupantes noites sem sono.

             A espera por qualquer coisa sempre fora o pior dos seus defeitos. E a vida sozinho havia o tornado alheio a esse defeito porque suas manias, sua falta de senso para as coisas o deixara fechado para a percepção do outro. Seus livros eram o único esmero. Limpava-lhos todas as poeiras e deles permitia-se esperar por mais um, até que a prateleira se completasse. Somente assim sabia lidar com a espera.

            Ele tentava entender o sonho anterior. Na verdade, ele lembrava parcamente do que havia acontecido no sonho, mas podia se lembrar claramente de seus papéis amarelos. Eles tinham sido banidos de sua vida. Não representavam mais nada. Eram pura influência de Álvares de Azevedo, de Byron, de Oscar Wilde em De profundis. Era uma lembrança da morte; da morte em seus planos mais significativos de renascimento, de ressurreição, de novas perspectivas. A morte naquele incêndio era o reflexo de um suicídio de uma vida repleta de dor e ódio. Naqueles papéis amarelos sobreviveu um outro homem que não é o de hoje. O sonho tinha a ver com renascimento, com procura pelo novo, pela vida.

            “- Mas o que aquele sonho tinha a ver com minha ansiedade?”, perguntou-se sem reposta. Lavou o rosto. Foi trabalhar.

 

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Continuação , parte III

            Embora tivesse de controlar seus desejos, ele não conseguia. Assistia ao telefone como se fosse o último capítulo da novela das oito. Não parava de fitá-lo. Foi assim por horas, até que adormeceu.

            Dia seguinte, a academia estava lotada. Ele se mantinha concentrado em seus exercícios. Apesar de saber que a possibilidade de revê-lo era muito grande, sublimava sua ansiedade na perfeição dos exercícios. E continuou fazendo-os até que sentiu alguém lhe pedir para revezar no equipamento de supino. Quando virou para ver quem fizera o pedido:

– Claro que podemos revezar. Respondeu ele prontamente com um sorriso efusivo em seu rosto.

            Sua felicidade era saber que o dia seguinte não seria como os anteriores. Havia sim a possibilidade do diálogo, mesmo depois de uma noite de sexo animal, mecânico e quase anônimo. A última vez, a primeira vez fora de poucos diálogos antecipatórios, houve apenas o som audível dos gemidos de gozos que aos dois soava como a melhor das melodias.

– Você quer que te ajude com o peso? Quanto você suporta? O outro perguntou com um sorriso saliente. Claramente seu questionamento tinha certa ambigüidade. A noite do primeiro encontro havia sido sem precedentes. Ele havia suportado todo seu peso em posições de um sexo-tântrico em que o seu êxtase esteve na existência de posições novas e prazeres até então não experimentados. O gosto de sexo no ar; o ar úmido dos vapores do corpo; sua fortaleza na condução das performances dos atores. Ele tomara de conta de todas as cenas, de todas as pausas e de todas as seqüências finais.

– O que você vai fazer hoje à noite? Ele perguntou com a inflexão de quem não dava alternativas, como se a única resposta fosse a afirmativa. Para ele aquele dialogo já tinha sido suficiente, satisfatório, porque antes havia somente o momento particular do gozo egoísta, do prazer solitário. Mas aquele tinha sido diferente: houve o sexo e houve o diálogo. Isso nunca antes acontecera. E o convite ficara no ar; a pergunta que fazia seu coração palpitar permanecia sem reposta. Enquanto o outro terminava a série de exercícios seu coração não se agüentava de ansiedade. A reposta veio logo com o último esforço, o último suspiro:

– Tenho compromisso hoje, mas quando puder te ligo. Me dá teu telefone!

A decepção foi instantânea, apesar de não poder disfarçar, sua voz ficou embargada e emendou seu nervosismo com um exercício não programado. Sentou-se no banco e começou a realizar a série, deixando o outro a esperar por sua reposta. O convite ficara no ar.

Sem disfarçar sua decepção, mas ainda esperançoso, foi até a recepção para anotar-lhe o número. Entregou-o em sua mão e foi embora. Mas antes que pudesse sair da academia deu o último olhar em direção ao outro.

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Continuação ( Ele não beijava)

 -Você quer subir para beber água? Um deles perguntou despretensiosamente. O outro já havia dito que o tempo para aquele momento seria somente para os primeiros contatos. No entanto, o primeiro estava completamente assertivo, desejoso de um beijo e quem sabe sexo despretensioso.

– Eu vou aceitar a água. Disse o outro bem mais tranqüilo e seguro de sua necessidade.

Quando os dois subiram os corações pulsavam de tanto esforço. Os lances de escadas haviam deixado suas respirações sôfregas e velozes. O sangue pulsava em seus corpos enchendo-os de vida e ânimo. Os passos eram mudos, mas os pensamentos uivavam como lobos no cio. Os dois prosseguiram até o último lance.

Quando um deles abriu a porta o outro já estava quase dentro. Uma euforia que o deixava desconcertado diante do pudor do outro. Mas o dono do apartamento, estava mais seguro dentro de seu espaço. Estava completamente consciente de onde colocar suas mãos e onde direcionar o beijo. E quando se aproximou, na iminência do beijo que não se podia guardar. O outro virou o rosto, redirecionando a mão que ia ao encontro da cabeça para a direção de seu sexo pulsante. Nesse momento, não havia mais pudores e o dono do apartamento- um deles- já havia se entregado aquele momento completamente.

Foi muito rápido para um deles. Afinal não havia beijo, apenas a libido desenfreada dos dois.

Mas ele não beijava. E para o outro isso era um entrave para as outras coisas, as outras palavras. O que haveria de existir depois dos toques e dos líquidos expelidos? Ele se perguntava desde que entraram no apartamento.

O outro permaneceu em êxtase até os breves momentos daquele instante de euforia. Ficara absorto, sem palavras. Pediu água e se despediu sem muita cerimônia.

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