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Ele não beijava ( Final)- o conto completo encontra-se na página Contos.

             Ele tinha certeza de que nesses anos havia apenas beijado uma única boca além da dele. Ele nunca havia traído. Aquele beijo foi apenas uma fraqueza diante de tantas desventuras por qual passava sua relação. Às vezes se perguntava se realmente deveria ser somente dele. Mas no íntimo acreditava que tudo redundaria em compromisso sério.

            Mas hoje parecia que seu mundo havia desabado. Não podia acreditar que em suas mãos estava a confirmação de sua sentença antecipada de morte. “-Não, não…” disse reiteradas e inaudíveis vezes. Apenas para si. Guardou aquele momento. Silenciou em si uma verdade mortal.

            “-Como pude ter sido atingido pela foice mortal, se ao menos não me expusera a nenhum risco?” Sua mente se perguntava sem respostas. Um flashback de momentos diversos passou pela sua cabeça. Em minutos toda sua vida tinha sido passada a limpo.

            Pensou, pensou e não havia uma pessoa sequer que poderia ter sido tão cruel e insensível. Olhou novamente para o exame e não quis acreditar. Pensou em ligar para o melhor amigo. Mas tinha receio da rejeição, da conseqüente pena e de uma revolução em sua vida.

            Pensou, pensou…

            Havia uma possibilidade sim. Uma loucura de pensamento. Ficou a contemplar a foto do outro. O outro. Aquele único objeto de sua atenção e devoção. O outro que tinha em si a definição de castidade e ingenuidade. Isso, o outro era ingênuo. Não podia ser ele o algoz. Mas por dentro pressentia a dor de uma punhalada iminente; um corte vivo, sangrando quase que real. Via na foto os olhos dele em tom de vermelho. Lágrimas pareciam cair e caíam com a violência de um rio. Ficou parado fitado os olhos do outro. Vi-o de joelhos implorando perdão. E o rio inundava sua vida de ódio, de medo, de morte.

            Pensou mais uma vez na possibilidade como um erro imperdoável. Não podia ser ele.

 

(…)

 

            Aquele dia tinha demorado anos. O tempo parecia ter parado, mortificado. O sangue tomava de conta de todo o apartamento e quase poderia ter-lhe sufocado. Então, o outro chega. O encontro havia sido marcado sem nenhuma pretensão. Ele havia controlado a emoção, enquanto o outro viria ao encontro com a alma cheia de sua constante ingenuidade.

            “-O que significa isso?”, perguntou sem deixá-lo entrar. E sem saber do que se tratava, pegou os papéis e leu atentamente. Uma espécie de brisa gelada percorreu todo seu corpo e deixou-o imóvel, sem palavras. Por alguns instantes olhou fixamente o papel sem saber o que fazer.

             “Vamos, o que você tem a dizer?”

             “Eu, eu… vou te ajudar…” Falou sem pensar.

             “Como vai me ajudar? Não te preocupa o fato de eu ser o que não posso ser mais; de não ter mais o tempo de amanhã? É assim que deve ser?” Perguntou ele quase chorando.

            O outro ainda não conseguia se desvencilhar do frio que o petrificava. O papel ficou refletindo uma luz de culpa, focando em sua face o nome do pior dos assassinos. Aquele algoz que poderia ter se furtado do encargo e ter-lhe perdoado de seus próprios erros. “Poderia ter evitado“, pensou como se fosse seu último pensamento. De repente, num impulso inconseqüente, correu de encontro a janela aberta como se quisesse voar para longe dos problemas. Quis saltar, para do alto, se sentir leve; mais livre; menos perigoso. Tentou correr desesperadamente e, no impulso para a morte, seu braço o impedira.

            Ele segurou forte o braço do outro. Ele não deixaria que seu grande amor fosse perdido de uma forma trágica. Não imaginava que seu plano para a confissão terminasse em mais dor. Queria apenas a assunção da culpa e um compromisso mais sério. Queria ele por completo, sem mais segredos e sem distâncias. Queria-o assim, bem perto; sem mentiras, sem desculpas, sem mistério. Queria-o assim bem perto de sua pele, bem próximo de seu rosto e demoradamente perdido em sua boca.

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